O 'Código'
Confesso que só consegui ler aí umas 50 páginas de O Código Da Vinci, de Dan Brown, antes de o pôr de lado e passar a leituras mais interessantes. Nunca fui grande adepto desta modalidade de ficção conspirativo-esotérica e pseudo-histórica em banho de thriller, que exige o talento, a erudição e o sentido de humor de um Umberto Eco para conseguir a minha suspensão da descrença. Assim não pensam os milhões de ávidos compradores do livro em todo o mundo, muitos dos quais já se deram ao trabalho de ir visitar os locais referidos no enredo da obra (caso do Louvre, em Paris, e da Igreja de Santa Maria Delle Grazie, em Milão) em excursões organizadas para o efeito, e ainda esportularam uns cobres extras para comprar os livros que, por sua vez, se propõem, muito seriamente, «descodificar» a obra de Dan Brown. O fenómeno do best-seller não me faz espécie, tudo pelo contrário. O que me mete impressão é que haja pessoas - e não são poucas - que encarem uma construção ficcional baseada em dados pretensamente históricos, fantasias esotéricas e interpretações descabeladas de obras de arte (a Última Ceia, de Leonardo Da Vinci), como uma obra rigorosa de não ficção, que supostamente traz à luz «verdades» ocultas, secretas e «incómodas» para instituições poderosas como a Igreja Católica (um alvo muito original, sem dúvida...). Como também me impressiona que pessoas responsáveis se dêem ao trabalho de fazer palestras para rebater, enfática e laboriosamente, as «teses» de Dan Brown, como foi o caso, ontem, do padre Carreira das Neves, em Lisboa. É dar ao livro uma importância que ele não tem nem nunca terá. Acreditar em O Código Da Vinci é um pouco como acreditar em Os Salteadores da Arca Perdida, mas a verdade é que a credulidade humana tem uma profundidade abissal. E quem a sabe explorar industrialmente é quem ri por último, enquanto deposita mais umas royalties no banco.
Eurico de Barros
Retirado do Diário de Notícias, 20 de Novembro de 2004.
Eurico de Barros
Retirado do Diário de Notícias, 20 de Novembro de 2004.
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