Abaixo o (mau) capital
Num Portugal politicamente maduro, “esquerdas” e “direitas” inteligentes chegam às mesmas conclusões, tradutoras de (con)senso. Na verdade, que interessa se o gato é branco ou preto, desde que cace os ratos?
Há poucos dias, reparei que uma dessas ideias, “consensuais”, insistia no “crescimento económico, mas com as pessoas”.
“Com as pessoas” queria dizer, penso eu, que não há economia sem sociedade. Que não há enriquecimento nacional, continuando a pobreza.
Noutros tempos, um lado acharia que, em termos de capital, cada um sabe de si, e que a lei do mais forte do feudalismo se poderia, com vantagem, adaptar à revolução industrial.
Quanto à outra facção, insistiria, como no delirante vídeo da Torre Bela (durante o PREC), que um homem não pode sequer ter uma enxada como sua. Além da camisa suada e dos trapos da cama, e pouco mais (em teoria), no Paraíso da Classe Operária só haveria ou “propriedade pessoal”, de subsistência, ou propriedade colectiva. “Privado” era anátema.
Mas hoje, quando se diz que “as exportações puxam a economia”, reconhece-se que, sem a locomotiva de companhias sólidas, não há comboio fora da estação.
Que “companhias sólidas”, porém? As presumivelmente enormes ou as realmente boas? O livro de sucesso de Bo Burlingham, Small Giants (Penguin 2005), dá pistas suficientes. O subtítulo de Pequenos Gigantes é Companhias que decidem ser excelentes, em vez de grandes. Desfia muitos casos da vida real, com empresas que, conscientemente e por opção, conseguem ser lucrativas mas limitadas, em vez de enormes e medíocres.
No fundo, trata-se de adquirir qualidade, e de ter consciência da mesma. O melhor gelado do mundo poderia vender-se mais, e mais barato, se baixasse os padrões de controlo de dois componentes. E por isso não os baixa.
Não se pode nunca abandonar este conceito, num país periférico como Portugal, que, ainda assim, possui núcleos e nichos de excelência, “pequenos gigantes” convictos. Mas não é tudo.
O “consenso”, além das parvoeiras partidárias, precisa de combater a “deslocalização”, se esta se fizer de má-fé, com tabula rasa sobre prémios e isenções administrativas, fiscais e financeiras, por más razões (a exportação do esclavagismo, por exemplo), e ainda por cima para membros presentes, ou potenciais, da União.
Por outro lado, o “consenso” deve perguntar porque piora o investimento japonês, alemão ou americano entre nós: demasiadas regalias do trabalhador português (quem dera), ou excessivos entraves burocráticos, falta de qualidade de serviços, instabilidade política, corrupção, etc.?
O “consenso” deve remar, no sentido de atrair os projectos prestigiados de desenvolvimento, cristalinos, mesmo se arriscados.
Mas, para isso, numa Europa que, como diz Charles Kuprhan, “se re-renacionaliza”, precisa de expulsar o mau capital, e meditar, sem tabus, nas relações entre o dinheiro e a Pátria. Isto é, o povo.
Nuno Rogeiro
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