De erro em erro
A situação que agora se vive no Líbano tem algumas semelhanças com a asneira que foi "o Iraque". Aliás, uma e outra, de certa forma, estão ligadas.
Com a queda de Sadam e a consequente instalação da anarquia no Iraque, o Irão ganhou, de um momento para o outro (meses), um peso na região que de outra forma dificilmente alcançaria. Com isto, pôde não só dedicar-se com mais afinco ao programa nuclear, como assumir sozinho e sem se preocupar com o vizinho do lado a dianteira na cruzada contra o ocidente, armando, estimulando e orientando uma série de grupetas, grupos e grupelhos terroristas instalados nos vários países do médio oriente. Dois deles, já se sabe, o Hamas e o Hezbollah.
Perante as recentes incursões e raptos de soldados por estes levadas a cabo nas fronteiras israelitas, Ehud Olmert poderia ter reagido como fizeram os seus imediatos antecessores em semelhantes situações: uns rockets para Gaza, umas bombas para o sul do Líbano, um gajo de cadeira-de-rodas pelo ar, a captura de uns tipos de barba e turbante, uma resposta de baixa intensidade para gerir o conflito em baixa intensidade.
Mas não. Se em Gaza a reacção foi mais ou menos moderada, no Líbano Israel deu vários passos adiante. Ou atrás, se tudo correr como se começa já a adivinhar.
Uma guerra em larga escala tem de ter razões e objectivos precisos. Defender o território de uma ameaça séria e actual à sua integridade; conquistar (a título mais ou menos definitivo) território alheio ou acabar de vez com um inimigo. Tal como no Iraque, parece que nenhuma destas razões se verifica nem nenhum destes objectivos será conseguido.
O território de Israel, por mais que os defensores da causa se esforcem por tentar demonstrar o contrário, não estava a correr perigo sério e actual. Algumas populações vivem sob medo e tensão, seja por causa do terrorismo intermitente, seja por causa da proximidade a fronteiras hostis. Mas o território, a sua integridade, não estavam a ser ameaçados, até porque, neste momento, nenhum país vizinho tem capacidade para entrar em guerra com Israel, nem tão pouco Hamas e Hezbollah têm arte ou engenho para ameaçar de modo sério a sua integridade territorial.
Por outro lado, Israel não quer, nem pode, ocupar o Líbano e aí instalar-se, transformando-o num enorme colunato. A experiência anterior correu mal, e internacionalmente tal situação tornar-se-ia rapidamente insustentável.
Por fim, Israel também não pode dizimar o Hezbollah, pois o Hezbollah, que não é um Estado, está por todo o lado e em lado nenhum. Para acabar com este inimigo, seria necessário arrazar todo o Líbano, e a seguir toda a Síria, e a seguir o Irão, e a seguir quase todo o mundo muçulmano. Uma vez mais, Israel não quer e não pode ir por aí, pois tal implicaria milhões de mortos, milhões de "danos colaterais".
A situação actual, a continuar por mais algum tempo, levará a um resultado semelhante ao do Iraque. Passar-se-á do mau para o péssimo. Em vez de um Estado fraco (hostil, no caso do Iraque), mas ainda assim controlável (e até amigo, no caso do Líbano), passar-se-á para um território em pantanas, onde reinará a anarquia e proliferarão todos os Hezbollahs deste mundo e do outro. Populações à partida pacíficas, tenderão a revoltar-se e a alinhar com a "guerra ao Ocidente". O Irão será cada vez mais o farol e amparo dos muçulmanos em fúria. Os muçulmanos em fúria serão cada vez mais, os muçulmanos de boa vontade cada vez menos. Israel perderá autoridade moral, crédito e confiança perante a famosa "comunidade internacional". A famosa "comunidade internacional" começará a perder a paciência para com Israel. Tal e qual como acontece com os Estados Unidos no pós-Iraque.
E, no fim de mais esta história, chegar-se-á à brilhante conclusão de que mais valia ter ficado quieto. Ter deixado tudo como estava: uma guerra fria, com alguns pontos quentes. Umas vezes mais, outras vezes menos. Porque tal como não havia armas de destruição massiva em Bagdad, também não haverá milagres em Beirute.
Eduardo Nogueira Pinto
Retirado d'A Sexta Coluna.
Com a queda de Sadam e a consequente instalação da anarquia no Iraque, o Irão ganhou, de um momento para o outro (meses), um peso na região que de outra forma dificilmente alcançaria. Com isto, pôde não só dedicar-se com mais afinco ao programa nuclear, como assumir sozinho e sem se preocupar com o vizinho do lado a dianteira na cruzada contra o ocidente, armando, estimulando e orientando uma série de grupetas, grupos e grupelhos terroristas instalados nos vários países do médio oriente. Dois deles, já se sabe, o Hamas e o Hezbollah.
Perante as recentes incursões e raptos de soldados por estes levadas a cabo nas fronteiras israelitas, Ehud Olmert poderia ter reagido como fizeram os seus imediatos antecessores em semelhantes situações: uns rockets para Gaza, umas bombas para o sul do Líbano, um gajo de cadeira-de-rodas pelo ar, a captura de uns tipos de barba e turbante, uma resposta de baixa intensidade para gerir o conflito em baixa intensidade.
Mas não. Se em Gaza a reacção foi mais ou menos moderada, no Líbano Israel deu vários passos adiante. Ou atrás, se tudo correr como se começa já a adivinhar.
Uma guerra em larga escala tem de ter razões e objectivos precisos. Defender o território de uma ameaça séria e actual à sua integridade; conquistar (a título mais ou menos definitivo) território alheio ou acabar de vez com um inimigo. Tal como no Iraque, parece que nenhuma destas razões se verifica nem nenhum destes objectivos será conseguido.
O território de Israel, por mais que os defensores da causa se esforcem por tentar demonstrar o contrário, não estava a correr perigo sério e actual. Algumas populações vivem sob medo e tensão, seja por causa do terrorismo intermitente, seja por causa da proximidade a fronteiras hostis. Mas o território, a sua integridade, não estavam a ser ameaçados, até porque, neste momento, nenhum país vizinho tem capacidade para entrar em guerra com Israel, nem tão pouco Hamas e Hezbollah têm arte ou engenho para ameaçar de modo sério a sua integridade territorial.
Por outro lado, Israel não quer, nem pode, ocupar o Líbano e aí instalar-se, transformando-o num enorme colunato. A experiência anterior correu mal, e internacionalmente tal situação tornar-se-ia rapidamente insustentável.
Por fim, Israel também não pode dizimar o Hezbollah, pois o Hezbollah, que não é um Estado, está por todo o lado e em lado nenhum. Para acabar com este inimigo, seria necessário arrazar todo o Líbano, e a seguir toda a Síria, e a seguir o Irão, e a seguir quase todo o mundo muçulmano. Uma vez mais, Israel não quer e não pode ir por aí, pois tal implicaria milhões de mortos, milhões de "danos colaterais".
A situação actual, a continuar por mais algum tempo, levará a um resultado semelhante ao do Iraque. Passar-se-á do mau para o péssimo. Em vez de um Estado fraco (hostil, no caso do Iraque), mas ainda assim controlável (e até amigo, no caso do Líbano), passar-se-á para um território em pantanas, onde reinará a anarquia e proliferarão todos os Hezbollahs deste mundo e do outro. Populações à partida pacíficas, tenderão a revoltar-se e a alinhar com a "guerra ao Ocidente". O Irão será cada vez mais o farol e amparo dos muçulmanos em fúria. Os muçulmanos em fúria serão cada vez mais, os muçulmanos de boa vontade cada vez menos. Israel perderá autoridade moral, crédito e confiança perante a famosa "comunidade internacional". A famosa "comunidade internacional" começará a perder a paciência para com Israel. Tal e qual como acontece com os Estados Unidos no pós-Iraque.
E, no fim de mais esta história, chegar-se-á à brilhante conclusão de que mais valia ter ficado quieto. Ter deixado tudo como estava: uma guerra fria, com alguns pontos quentes. Umas vezes mais, outras vezes menos. Porque tal como não havia armas de destruição massiva em Bagdad, também não haverá milagres em Beirute.
Eduardo Nogueira Pinto
Retirado d'A Sexta Coluna.
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home