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terça-feira, julho 18, 2006

A direita a pensar e a direita no poder

Num artigo recente, Boaventura Sousa Santos (Visão, 25 de Maio) queixa-se de que o pensamento de direita invadiu os meios de comunicação social e influencia muito o Governo.

Existe, de facto, algum vigor na nova direita. Em primeiro lugar, ela reúne pessoas (homens na sua maioria) que são de facto jovens. Alguns destes começaram por intervir na discussão política através da criação de blogues e revistas tal como a revista Nova Cidadania ou a revista Atlântico.

Nestes meios de comunicação, têm ocasião de defender posições revisionistas em relação ao Estado Novo, ao 25 de Abril ou à I República. Falando de temas mais contemporâneos, apoiam a Administração Bush no Iraque, criticam o Estado-Providência, propõem um Estado mínimo.

O aumento da participação política que acontece nos blogues não é monopólio da direita, ela tem ocorrido também à esquerda, e resulta não de uma viragem ideológica, mas da abertura do espaço público que proporcionou um pluralismo de opiniões nunca antes visto. Esses desenvolvimentos são claramente meritórios, porque são positivos para fortalecer a democracia.

Além disso, esta nova direita, bem como a direita que já não é tão nova não é unanimista, nem consensual pelo menos em relação a dois temas cruciais, embora possa haver seguramente outros. São eles o papel que o Estado deve ter na sociedade e a questão da moral e dos costumes. Poder-se-ia pensar que o posicionamento em relação ao Estado fosse idêntico para todas as direitas. De facto, existe um acordo superficial sobre a necessidade imperiosa de reduzir o papel do Estado. Mas também houve, já no final do mandato de Jorge Sampaio, um apelo que juntou empresários e pensadores de direita para que o Estado interviesse na defesa das empresas portuguesas da concorrência espanhola. Ou seja, à direita, o nacionalismo e o proteccionismo são valores caros a alguns, e aí ainda é preciso Estado. Tal como Vasco Pulido Valente repete, a direita mais tradicional também é estatista neste país.

Já em relação aos costumes, as direitas também se dividem, nomeadamente entre aqueles que são católicos praticantes e os outros.

Os católicos praticantes advogam valores conservadores, em relação a temas como a família, a saúde reprodutiva, a educação. Os outros são a direita liberal: advogam um Estado minimalista na economia, e um Estado minimalista na sociedade e nos costumes, rejeitando que o Estado deva servir para inculcar valores católicos conservadores à população em geral.

Mas, afinal, de que forma é que a direita a pensar influencia a direita nas instituições, hoje?

Em relação aos partidos de direita, não se vê grande impacto. Nos anos 80, O Independente serviu como viveiro de ideias políticas para reformular o CDS em CDS/PP. Primeiro com o líder Manuel Monteiro, e numa segunda fase como trampolim para Paulo Portas chegar a líder do partido. Neste momento, não se vislumbra reorientação liberal no CDS/PP, pelo contrário.

E qual a influência efectiva na direita no poder, isto é em Cavaco Silva? Para já podemos dizer que é nula. A primeira "presidência aberta" de Cavaco Silva foi dedicada à inclusão social. Esta semana esteve no interior do Alentejo para mostrar o que as instituições políticas públicas, nomeadamente as câmaras municipais, têm estado a fazer pelos excluídos. Pelas entrevistas que tem dado, o que Cavaco advoga não é claramente uma diminuição do papel do Estado. É, pelo contrário, uma reorientação, do betão para os recursos humanos, do investimento na infra-estrutura física para o investimento social.

Os mais cépticos dirão que a influência dos pensadores de direita dá-se sobretudo no Partido Socialista e no Governo. Parece-me que isso é ter memória curta em relação ao percurso do PS e algum enviesamento ideológico. O percurso do PS no Governo tem sido quase sempre o de adoptar medidas difíceis que a médio prazo se revelam importantes para o País. Era também a nova direita que influenciava o PS em 1977? As opções ideológicas do primeiro-ministro Sócrates inserem-se na tradição da social-democracia europeia, isto é uma social-democracia pragmática, que não é avessa ao mercado nem coloca o Estado acima de tudo. As diferenças, porém, podem não ser tão grandes como alguns que se situam à esquerda do Partido Socialista gostariam.

Nessa medida, e para já portanto, o balanço que se pode fazer do impacto da nova direita na política real parece limitado.

Marina Costa Lobo

Retirado do Diário de Notícias, 03 de Junho de 2006