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segunda-feira, agosto 28, 2006

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sábado, agosto 26, 2006

Novo livro de Pat Buchanan


Leia a review no Washinton Times e encomende na Amazon.

quarta-feira, agosto 23, 2006

Cindy Crawford

Este post foi inspirado pelos senhores Paulo Cunha Porto e Eurico de Barros. Creio que foi um bom mix, só para variar um pouquinho à habitual austeridade conservadora do estabelecimento. É favor carregar para aumentar.

Politicamente incorrecto ao quadrado

Dedicado ao Eurico de Barros.

A insustentável leveza da paz


Frágil, precária, incerta, violada, mas paz. A resolução 1701 da ONU, com todas as suas imperfeições e ambiguidades, deu aos inimigos libaneses, pelo menos, um pretexto para calar armas.

À medida que o 2.º, 3.º e 12.º batalhões do exército libanês atravessam a ponte Qasmieh, sobre o rio Litani, percebemos que as forças armadas do general Michael Suleiman, afinal, existem. E podem, pela primeira vez desde 1975, ambicionar o controlo integral do seu próprio país. No papel, o exército libanês tem cerca de 60 mil homens, mas o seu quadro orgânico está muito desguarnecido. A movimentação para o sul de um quarto dos efectivos teóricos é, assim, um ónus apreciável, mas mais complicada ainda é a missão.

Pouco tempo antes da incursão do Hezbollah, que levou a esta guerra, as forças especiais libanesas tinham ensaiado um exercécio antiterrorista, para o qual foram convidados todos os adidos militares em Beirute. Precisam agora de aplicar os seus conhecimentos técnicos, numa tarefa tão ou mais exigente: a manutenção do cessar-fogo, numa zona observada pelas unidades avançadas de Israel, e num complexo de 180 povoações onde o "Partido de Deus" tinha instalado os seus lança-foguetões.

Entretanto, continua o patótico peditório para a força internacional. Chegarão nepaleses, bengalis, malaios, indonésios, 200 franceses (muita parra, pouca uva), um contingente naval alemão, a ajuda aérea dos EUA e, espera-se, mais eficácia e músculo do que na UNIFIL.

Coragem política

Israel substituíra a imprecisa, mas cómoda, guerra aérea, por uma mais certa, mas custosa, operação terrestre. Depois, aceitou uma retirada rápida. Já deu a entender que todos os problemas em aberto (as quintas de Shebba, os prisioneiros, as zonas minadas) serão discutidos. O ministro da Defesa, Amir Peretz, sugeriu (para espanto de Washington) a chamada da Síria às conversações.

Os habituais críticos da política de Telavive deviam, neste momento, realçar a inteligência e a coragem do governo Olmert. Mas não o farão.

Raúl Castro diz que o irmão recupera, que não gosta da publicidade, que não há perigo de invasão, que a revolução está salva, que o povo é sereno. Para além do papaguear oficial, só muda o regime de Cuba, quando uma maioria substancial dos cubanos julgar lucrar com essa mudança.

O novo sistema operativo Windows foi já invadido por ciber-piratas, "hackers" e espiões. A situação é desesperada, mas não é grave.

Um miniconcílio da UE discutiu o "novo terrorismo". Falou em explosivos líquidos, segurança dos transportes, troca de informaçes, e... "a natureza do Islão europeu". Ou seja, ninharias e metafísica.

Nuno Rogeiro

Retirado do Correio da Manhã, 20 de Agosto de 2006.

O perigo do falso paralelo


Em fins de 375, o imperador Valente tomou a decisão de ceder à súplica dos visigodos, pressionados pelos hunos, permitindo que passassem a fronteira do Danúbio e se fixassem na Trácia. Este facto é normalmente referido como o marco inicial da queda do Império Romano. Hoje, perante o islão, o Ocidente sente-se em situação paralela. O acolhimento concedido aos imigrantes, em busca de uma vida melhor, é aproveitado pelos terroristas para ameaçar a vida e prosperidade dos anfitriões. O resultado, como então, é o mundo sentir-se envolvido numa espiral de violência, nascida do medo e ódio gerados pelo encontro de culturas. Este paralelo, que, explícita ou implicitamente, é glosado em milhares de análises, tem alguns laivos de plausibilidade, mas é essencialmente falso. Por exemplo, o quadro geo-político actual parece centrado na mesma questão da Antiguidade: saber se os muçulmanos, novos godos, se integrarão na civilização que os aceitou ou se, mantendo a hostilidade, acelerarão por dentro a sua decadência e destruição. Curiosamente, a lição da História mostra a inanidade da alternativa, porque na Antiguidade ambas as coisas se verificaram.

Pode dizer-se que as duas dimensões do problema que nos preocupa, embora sérias e difíceis, são muito diferentes da Europa no último quartel do século IV. O primeiro elemento da presente situação é, simplesmente, o confronto do islão com o desenvolvimento. A cultura muçulmana, porém, nada tem de comum com o barbarismo dos godos. Ela é uma das mais ricas, sofisticadas e poderosas civilizações da humanidade. Com grande dinamismo e flexibilidade, foi-se tornando a segunda mais globalizada de sempre. Actualmente sofre debaixo da dolorosa transformação gerada pela modernidade.

Trata-se do mesmo processo que o cristianismo, a mais global de todas, e o judaísmo, a mais resistente, sofreram há 200 anos. Hoje sabemos que ambas sobreviveram, mas o processo foi longo e muito difícil. Aliás, elas foram das poucas que resistiram, pois pelo caminho muitas outras culturas e elementos culturais soçobraram, do animismo ao xamanismo, passando pela aristocracia, monarquia absoluta, e também as lavadeiras, carruagens, chafarizes, perucas empoadas. Hoje é a vez de o islamismo, mas também o budismo e o hinduísmo, passarem pela mesma prova.

A adaptação da sociedade muçulmana à vida moderna tem-se revelado dolorosa e violenta, quer interna quer externamente. Esse processo está na base de boa parte dos conflitos do Médio Oriente, como da raiva dos terroristas. As comunidades residentes nos países ricos constituem uma importante vanguarda na busca dos caminhos que permitirão ao islão sobreviver a esta evolução.

A segunda dimensão da situação actual nasce do confronto do Ocidente com a globalização. Cavalgando a onda do progresso, a civilização europeia convenceu-se do seu domínio planetário. O sucesso foi evidente, mas a hegemonia trouxe-lhe alguns dos traços decadentes dos antigos romanos. A complacência, arrogância e tibieza são crescentemente evidentes na sua atitude diplomática. Pretenso arauto mundial da paz e democracia, tem repetidamene violado esses valores e é cada vez mais considerado como opressivo ou ignorante. Por outro lado, a sua degradação de costumes, que considera desinibida e libertária, é desprezada pelas outras culturas como vil e debochada.

Estes dois problemas são graves. Mas nem os árabes são bárbaros nem os ocidentais estão apodrecidos. Apesar das semelhanças, não está em causa a queda do império ocidental sob a pressão das hordas muçulmanas. Pelo contrário, um dos maiores perigos da situação actual reside precisamente no referido paralelo. As visões que crescentemente apregoam um "choque de culturas" fomentam aquilo que temem. O mal está em tratar a religião islâmica como inimiga da civilização e os muçulmanos como selvagens que só se integrarão se mudarem. O mal está em considerar o Ocidente como o "grande satã", que tem de ser derrubado e extirpado.

O quadro actual é muito diferente da antiga queda dos impérios. Mas se não for controlado, facilmente gerará horríveis morticínios. A única solução é fazer uma distinção fundamental. Os crimes são cometidos por criminosos, enquanto os povos, todos os povos e culturas, são compostos na sua grande maioria por pessoas pacíficas em busca de uma vida melhor. Afinal, os visigodos que o imperador Valente deixou entrar no império são os nossos antepassados.

João César das Neves

Retirado do Diário de Notícias, 21 de Agosto de 2006. João César das Neves está na Alameda Digital.

terça-feira, agosto 22, 2006

Recordando o Mundial 2006

Dedicatória

Dedico o postal anterior ao Sexo dos Anjos, creio que será a seu gosto.

Para os nostálgicos

segunda-feira, agosto 21, 2006

Mais conservadores a dizer verdades na MSNBC

Pat Buchanan sobre guerra no Líbano

Pat Buchanan na MSNBC

domingo, agosto 20, 2006

Um segredo chamado Artur Gonçalves


É o homem de quem se fala Artur Gonçalves, fadista dos anos 70. Há poucas semanas, as suas músicas foram gravadas de vinil velho para formato mp3, chegaram à internet e causaram furor junto de uma juventude que desconhecia a sua existência. O radialista Nuno Markl não demorou a passar as músicas no seu programa da Antena 3. Os novos fãs aumentaram. E, nos dias que correm, são cada vez mais aqueles que perguntam: afinal, o que é feito do artista? O JN encontrou a resposta.

Artur Gonçalves chega à entrevista com a mão a afagar a barriga "Acabei de comer um empadão de torresmos", diz. No bolso das calças esconde um cantil de aço inoxidável para bebidas destiladas. O homem é uma personagem fascinante: aos 71 anos, fala pelos cotovelos, esbraceja, é muito expressivo. E conta-nos a sua história: "Fui um pé descalço na Mouraria e a minha mãe vivia numa barraca em Campolide".

Cantor antifascista

Em 1973, gravou o seu primeiro fado "Não passes mais com ele na Musgueira"debruça-se sobre o caso de um ciumento que difama a ex-mulher por esta ter passado com outro à frente de sua casa. É ficção, uma tragicomédia. "Isso ia dando um caso em tribunal", lembra o artista. Tudo porque nessa mesma altura, houve um caso real de um casal da Musgueira que se separou. E a letra, que numa perspectiva marialva enxovalha a mulher, foi acusada de inspiração realista: "Meteu-se-lhe na cabeça que o homem tinha vindo falar comigo e que eu estava a cantar sobre ela", conta o fadista. Mas depois tudo acalmou: "Eu nunca cheguei a conhecer essa marreca".

Uma das facetas de Artur Gonçalves reside na postura política, intervencionista e antifascista das suas letras, a maior parte escritas e gravadas no segundo semestre de 74, depois da Revolução de Abril. Entre as gravações de "Ser fascista" ou "Vamos dar caça à PIDE", o cantor de intervenção garante "Andava sempre nas manifestações para correr com aqueles filhos da...". Não obstante, acusa: "O PCP pôs-me logo de lado". E em que esquerda se situa Artur Gonçalves? "Na ala esquerda do PS", assume sem problemas aquele que já conheceu o amargo sabor da censura - antes e depois do 25 de Abril.

"Eu era o 'raistaparta' e escangalhava alguns fados", sustenta, orgulhoso. As suas letras, em forma de quadras, quintilhas ou sextilhas, são hilariantes.

Artur Gonçalves explica o que o inspirava "Escrevia quanto tinha uma ideia na pinha, quando ouvia um anedota ou quando lia uma notícia no jornal", recorda. E cita um exemplo de uma música "que não me deixaram gravar". A história conta-se assim: "Foi uma bronca há muitos anos: havia um conjunto de putas que andavam a atacar no Bairro Alto. Os quartos não tinham chave e então qualquer pessoa podia lá entrar - elas penduravam o casaco dos clientes na porta e faziam com que os homens se deitassem de costas para a entrada. Os gajos que tinham a carteira no bolso do casaco eram roubados por quem lá entrava. No total roubaram mais de 30 mil contos!", grita, impressionado. Vai daí, escreveu a seguinte quadra: "No Bairro Alto, ali na rua da Barroca / uma quadrilha foi caçada certa vez/ aproveitavam-se dos despejos da piloca/ para despejarem a carteira do freguês". O artista barafusta: "Falei em pilocas e não me deixaram gravar!". E não sustem a revolta: "Embirraram comigo! Ainda ontem vi na televisão alguém dizer "filhos da p...". Não entende por que o impediram de gravar: "É que anda na boca de toda a gente..." (a palavra, entenda-se).

Na despedida, o fadista fez questão de nos oferecer a cassete de "Deixem a minha gaita em paz". A canção é um clássico instantâneo.

Daqui.

Afinal

Favor ignorar o post anterior, encontrei uma entrevista do personagem que vou postar de seguida.

Quem é (ou foi) Artur Gonçalves?

Estava eu muito bem a ler a entrevista do Legendary Tiger Man na Sábado e o músico menciona um exemplar da sua vasta colecção de discos, o disco "Ser Fascista" do fadista Artur Gonçalves.
Fui ao Google, e encontrei este blogue.
Mas não esclarece quem é, ou quem foi... alguém me auxilia? (não, não sou adepto, nem de perto nem de longe dessa direita, mas fiquei curioso com a personagem).

sábado, agosto 19, 2006

Diz não ao neoconservadorismo

No último número da Spectator, Malcolm Rifkind, antigo ministro dos negócios estrangeiros inglês, escreve um artigo notável com um título sábio: The Conservatives must reject neo-Conservatism.

Muito resumidamente, os conservadores devem reconhecer que a invasão do Iraque foi um erro grosseiro; não devem aceitar a divisão maniqueísta do mundo em "bons" e "maus"; e devem rejeitar a doutrina da guerra preventiva.

Em Portugal, país onde parece não haver conservadores, estas coisas são difíceis de entender. Aqueles que, da Direita, criticaram a guerra do Iraque e levantaram dúvidas sobre a eficácia da guerra do Líbano foram: a) empurrados para a extrema-direita, b) empurrados para a esquerda, c) acusados de traição, d) acusados de anti-americanismo, e) acusados de anti-semitismo, f) acusados de serem "amigos dos terroristas", e mais um sem número de barbaridades.

Para as outras direitas - a liberal, a neoconservadora, a nova direita, a que ainda não sabe bem o que é - não basta apoiar as mesmas causas. É preciso caucionar os mesmos procedimentos, seguir os mesmos caminhos e dizer sim às mesmas estratégias, mesmo que sejam as erradas.

É claro que os conservadores gostam da América e apoiam o Estado de Israel. É claro que os conservadores querem combater ferozmente o terrorismo. É claro que os conservadores não querem ficar de fora. Mas há várias formas possíveis de o fazer - de participar, de ser amigo dos amigos, de apoiar os aliados, de combater os inimigos comuns.

Um conservador deve, antes de mais, olhar para a realidade. Apreender a realidade e aprender com ela. E se é verdade que a realidade nos diz que, após o 11 de Setembro, o mundo mudou e está em curso uma guerra contra o terrorismo islâmico, também não deixa de ser verdade que a realidade é rica, vasta e nos ensina muitas outras coisas:

Em primeiro lugar, que a invasão do Iraque foi um erro. Foi inútil (não havia armas de destruição massiva) e perniciosa (emergência do Irão como principal potência local e ameaça global, guerra civil, etc.). Os conservadores devem preservar a credibilidade. Negar o óbvio é tarefa para neoconservadores.

Em segundo lugar, e por mais que às vezes dê a ilusão do contrário, que o mundo não é a preto e branco. Não é possível montar uma estratégia eficaz de combate a ameaças como o terrorismo e o fundamentalismo islâmico com base em divisões simplistas do género "bons e maus", "totalitaristas e democratas", "sensatos e loucos". Pelo meio destas dicotomias, existe um sem número de realidades que é preciso compreender. Nem todos os muçulmanos são "maus", nem todos os ocidentais são "amigos", nem todo o mundo árabe é hostil, nem todos os que pensam de maneira diferente são "estúpidos".

Em terceiro lugar, que a doutrina da "guerra preventiva" ou, nas palavras de Tony Blair, do "intervencionismo liberal", é irrealista e, portanto, disparatada. A guerra deve ser feita para combater ameaças sérias e actuais, e nunca para defesa de ameaças presumíveis ou hipotéticas. Para isso existe a diplomacia.

Para um conservador, a diplomacia é a principal via de entendimento dos Estados. Não a diplomacia da "comunidade internacional", personificada na ONU, que já deu provas de servir para pouco. Mas a diplomacia dos Estados, a grande diplomacia, feita por diplomatas informados, com capacidade de dissuasão e facilidade de diálogo, firmes na rejeição de conversar com terroristas, mas sem medo e preconceito de se sentarem à mesa das negociações com outros Estados soberanos e independentes, ainda que inimigos.

O conservador deve privilegiar a diplomacia, exactamente porque, não sendo um pacifista, sabe que, como último recurso, se a diplomacia falhar, há sempre a guerra.

Eduardo Nogueira Pinto

Retirado do blogue da Atlântico.

As minhas memórias de Marcello Caetano

No fim da década de 50 do século passado, fiquei ligado à vida de Marcello Caetano, de forma involuntária. O meu pai, que fora seu aluno de Direito, que se tronou amigo, e que, como outros jovens do seu tempo, acreditava no Marcellismo, convidou-o para ser meu padrinho de baptismo.

A madrinha não era a sua mulher, mas a lindíssima, carismática e inteligente Ana Maria, a filha mais nova. Na verdade, já se sabia, na altura, do estado de saúde grave de Teresa de Barros Caetano, irmã do professor Henrique de Barros, opositor ao Estado Novo e, depois de 1974, uma figura importante no PS.

O casal Caetano esteve na cerimónia, na velha igreja paroquial de Algés (na altura vivíamos num modesto apartamento da então vila), mas Marcello, que levava a sério a tarefa dos padrinhos (como verdadeiros substitutos dos pais, no caso de morte destes), preferiu que Ana Maria, jovem e vibrante, assumisse, com ele, esse ónus.

Todos os aniversários recebia, dos padrinhos, uma libra de ouro, mas convivia muito mais com a Ana Maria (que se tornara numa grande amiga e confidente da minha mãe) do que com o Professor Marcello. Fui percebendo, no fim da minha infância, que o Marcelismo se afirmava como aquilo a que a Ciência Política chama “grupo de interesse”, de “pressão”, ou lóbi. E quando, no fim do 1º ano no Liceu Pedro Nunes, um professor de Ginástica (depois próximo do PCP) me deu os “parabéns” pela nomeação do novo primeiro-ministro, percebi que era testemunha privilegiada – embora precoce, e limitada – de uma época determinante.

O fim de Salazar

Quando Salazar teve o seu acidente cardiovascular, a seguir à queda na Fortaleza de Verão (cuja renda insistia em pagar, quando lá passava férias), lembro-me de que estava na Pousada de S. Lourenço, na serra da Estrela, com os meus pais e o meu irmão, maravilhados com os ensopados de borrego, os jogos de damas e a maravilha granítica do local.

Penso que, na altura, também lá ficavam os nossos inseparáveis tios Fernando (irmão do meu pai) e Maria Elisa (irmã da minha mãe), que casaram no mesmo dia, à mesma hora e no mesmo sítio, em Seixo da Beira. O meu pai, depois de passar pela magistratura do Ministério Público e pela Caixa de Previdência (onde ajudou a montar um dos primeiros sistemas nacionais de segurança social), dedicou toda a vida à Emissora Nacional, hoje RDP (dela foi director administrativo e presidente), só saindo para director-geral da Informação, e, à beira do 25 de Abril, o último ministro da Saúde do “consulado Marcellista”.

No meio das brincadeiras com os meus primos, entre o futebol e as explorações da serra, vimos o ar carregado de todos. Apesar de só vir a extinguir-se anos depois, todos os mais velhos percebiam que o ciclo (humano e político) de Salazar tinha terminado.

Dias passados, na clínica onde jazia o estadista moribundo, vi uma cena revoltante, que não esqueço: uma altiva senhora “da alta”, vestida a rigor e pérola, recebia o beija-mão de gente humilde, que se ajoelhava. Duzentas famílias? Idade Média?

Jurei que, quando crescesse, queria o oposto daquilo.

Marcello, Gorbachev, Kerenski e etc.

Podem fazer-se paralelos entre Marcello, Gorbachev ou Kerensky, ou De Gaulle do fim?

Por um lado, sim, no sentido em que, como todos eles, se viu com um encargo impossível, que lhe criava genuínas dúvidas. A sua angústia histórica era enorme. Disse-mo em pessoa, escreveu-me em carta. Sabia que precisava de reformar o regime (ou continuá-lo), mas que a opção mais viável, mais imediata, era a revolução, ou o caos.

A sua aparente indecisão e contradições jurídico-políticas (e também o facto de estarem por divulgar muitos documentos e arquivos) criaram sensação de fraqueza, e até teorias de conspiração. A tese da sua conivência no 14 de Março e no 25 de Abril, propalada em Portugal e em Espanha (e que sempre o indignou), equivale a teoria semelhante, aplicada a Gorbachev, quando da sua ambígua posição de “sequestrado”, no golpe de Moscovo.

Poucos terão visto tão bem o problema como Vasco Pulido Valente (que não tem razões pessoais para ser Marcellista, antes pelo contrário), em As Desventuras da Razão. A democracia por ementa, tentada por Marcello, era impossível.

A “renovação na continuidade”, a aprendizagem pós-moderna da TV como arma política, nas Conversas em Família, a doutrina “democrática conservadora” de Em Defesa da Liberdade, o “favor” na abertura do Expresso, o ramo de Oliveira (ou mais do que isso) à “ala liberal”, a criação de governos tecnocráticos ou “pragmáticos” (pelo menos três do últimos ministros de Marcello aderiram ao PS, ou perto dele andaram) eram formas de quadrar um círculo. Os velhos adeptos do Estado Novo desconfiavam, os novos adeptos do Marcellismo quereriam mais, ou melhor, ou as duas coisas.

Ficou famosa, na altura, a brincadeira: “Com o professor Salazar, não percebíamos o que dizia, mas sabíamos o que queria; com o prof. Marcello, percebemos o que diz, mas não sabemos o que quer.”

Marcello, o grande e elegante cultor do português, o professor claro, o explicador minucioso, o curioso culto da História e da Filosofia, não gostou nunca desta blague. Mas ela corria nas ruas. E nos sítios selectos.

Prometeu esmagado

Fui sabendo de Marcello, até 1973, por telefonemas de circunstância (quase sempre para me cumprimentar pelo Quadro de Honra permanente no liceu) e por conversas com os meus pais.

Falara um dia preocupado, perante a possibilidade de multa por uma rádio sem licença, discutia as horas correntes da transição e reunia-se na Choupana, em São João do Estoril, com o grupo de colaboradores que considerava mais amigos, e mais leais. Nunca vislumbrei estes encontros, nem sequer para comer as batatas fritas em baldinhos, mas o que se passava lá dentro, diz-se, mudava o país.

Estivemos juntos poucas vezes, mas notei-lhe sempre um ar pesado e soturno, sobretudo a partir de 1973. O odor a fim de regime era claríssimo. Em Fevereiro de 1974, achou-se obrigado a escrever, e ler, um texto chamado, precisamente, Vencer a Hora Sombria, espécie de último apelo de um treinador que sabe já não ter equipa ou capacidade para chegar ao fim, mas que também não pode – nem que seja pela honra – admitir o caos pela porta principal.

No fim de 1973, num mês que não posso precisar, o malogrado João Paulo Tomás, neto do Presidente da República, benfiquista ferrenho e amigo chegado, chegou-me ao recreio com cara de caso. Disse-me, resumidamente, que o avô lhe falara do facto de a guerrilha africana estar a adquirir armas mais modernas que as portuguesas, e da “conspiração de Spínola e de Costa Gomes” contra o regime.

Marcello não aparecia “implicado” nesta descrição, feita muito antes do 25 de Abril, que deveria ser voz comum em Belém, para poder ser do conhecimento de um garoto de 15 anos.

Por essas alturas, soube da genuína surpresa de Marcello face ao massacre de Miriyamu, em Moçambique, que se dera em Dezembro de 1972, e onde um jovem graduado enlouquecido terá começado um excesso sanguinolento, que acabou com 60 mortos, quase todos civis (o sobrevivente, um miúdo que penso se chamava Ernesto, foi acolhido pela família Jardim). Marcello recebera informações vagas, primeiro, do general Kaúlza de Arriaga e do brigadeiro Armindo Videira, comandante de Tete, que não teriam sabido logo da extensão da atrocidade. Mas face à repetição de inquéritos não responsabilizadores dos comandantes responsáveis, Marcello decidiu pedir uma nova averiguação, penso que no Verão de 1973, e acabou por demitir o general Videira. Lembro-me de ter dito, em minha casa, que o fazia por uma questão de “princípio”, referindo que Portugal tina de conduzir uma guerra “limpa”, e guiada pelo Direito Internacional.

Jantar em família

Essa inconfidência passou-se num jantar de família, no fim de 1973, em casa dos meus pais (nessa altura, já em Miraflores, no prédio onde depois moraram Costa Brás e Oliveira e Costa, do PSD). A refeição melhorada era servida pelo Chefe Silva, depois conhecido nas revistas de culinária e na RTP, que na altura era o chef do Instituto de Altos Estudos Militares, em Pedrouços.

Lembro-me do interesse de Marcello, quando entrou no meu quarto, pela versão francesa do Dicionário de Filosofia, de André Lalande (na PUF), pela versão espanhola da Paideia, do Werner Jaeger, pelo 1984, do Orwell, e pelo Admirável Mundo Novo, do Huxley. Tinha pedido os dois primeiros livros ao meu pai, para um “ponto” (como se chamavam, na altura, os testes) e os outros dois tinham-me sido oferecidos pelo meu tio Fernando.

“Já vi que o Nuno tem leituras muito avançadas, para 14 anos”, dizia ao meu pai, que revelava ao padrinho o meu gosto pela Filosofia e pela História. “É um caminho essencial, meu filho”, afirmou Marcello. “Então e o Clemente Júnior?”, continuou, querendo saber coisas sobre o meu irmão mais novo, na altura fascinado por experiências químicas e engenhocas várias.

“O Clemente é um bombista!”, exclamou o meu pai com ternura, lembrando as cópias perfeitas que o meu irmão fazia de engenhos explosivos que via nas séries da televisão. Silêncio gélido. Era o tempo dos atentados contra os símbolos do poder.

“Bombista a favor do governo, claro...!”, rematou o meu pai, numa saída genialmente bem-humorada.

No resto da noite (e depois de um incidente em que Marcello bateu violentamente com a cabeça num candeeiro de tecto, ainda por cima pontiagudo), lembro-me de se falar no Congresso dos Combatentes no Ultramar, e mostrou as fracturas reais nas forças armadas. Falou-se também nos famosos decretos 353 e 409, sobre carreiras de milicianos e quadro permanente, remunerações e estatuto.

Vi Marcello Caetano genuinamente destruído. “Mas querem que eu ponha a polícia a prender a tropa?”, perguntava, impaciente.

Lembro-me de ter dito ainda alguma coisa sobre o uso generalizado de droga nas unidades de Moçambique, dos “generais sem prestígio entre os soldados e oficiais mais novos”.

Anos mais tarde, nas cartas, disse-me que seria importante publicar todas as actas do Conselho Superior de Defesa Nacional, para se compreender as posições dos chefes militares face à guerra. Sempre lhe notei uma profunda distância “civilista” em relação à hierarquia militar, que respeitava institucionalmente mas compreendia pouco, e cujo funcionamento lhe parecia anacrónico e ineficaz.

Lembro-me que teve ainda tempo para falar da “subversão galopante, à vista de todos”. Dissera que passara pelas Galerias Itaú, junto à Estados Unidos da América, e de só ter visto livros comunistas. Junto ao elevador de Santa Justa, por outro lado, vislumbrou uma banca “nacionalista”, com panfletos ofensivos e amesquinhantes. Quase todos comparavam a sua “hesitação” à “determinação” de Salazar. Explicou-me, em aparte, repetido numa carta de 1979, que uma coisa era governar “em longo período de estabilidade e outra entre fumos de revolução”. Lembro-me de lhe ter perguntado, também por escrito, se não eram também os dirigentes e os regimes que faziam a sua própria “estabilidade” ou “revolução”.

Já não respondeu. Morria no Rio de Janeiro em Outubro de 1980, depois de um agudo ataque de asma.

Nuno Rogeiro

Ritirado da Sábado, 17 de Agosto de 2006.

Às quartas com o "Público" (ainda não perdi um)

quinta-feira, agosto 17, 2006

Os inventores do mundo futuro


Para aqueles que estão acostumados a desprezar como “teoria da conspiração” a hipótese de que o Council of Foreign Relations trama com o Grupo Bilderberg e outros círculos de milionários a implantação progressiva mas rápida de um governo mundial, o próprio CFR acaba de dar uma resposta definitiva, num documento oficial em que assume de vez o projeto e a parceria tão longamente descartados pelos onissapientes comentaristas da mídia. No relatório “Building a North American Community”, recentemente divulgado, o mais poderoso think tank globalista dos EUA propõe nada menos que a abolição das fronteiras entre Canadá, México e EUA e a transformação do continente numa “área onde o comércio, o capital e as pessoas circulem livremente”, a base para “o ingresso mais fácil no território americano”.

Num momento em que a população americana em peso clama por um controle mais rigoroso das fronteiras e os especialistas militares alertam para os perigos incalculáveis do fluxo contínuo de terroristas e narcotraficantes camuflados de imigrantes ilegais chicanos, a declaração mostra o total desprezo da elite globalista bilionária pela segurança nacional. Não resta a menor dúvida de que o CFR planeja sacrificar friamente a nação americana no altar da unificação administrativa do mundo, a ser atingida, segundo a idéia do velho Morgenthau, por meio de progressivas integrações regionais.

Porém o mais surpreendente no relatório é a admissão de que a fusão dos três países deve ser feita “segundo as linhas propostas pelas conferências de Bilderberg e Wehrkunde, organizadas para fomentar as relações transatlânticas”.

Até agora, esses nomes jamais tinham aparecido num documento oficial do CFR. Bilderberg e Wehrkunde são grupos altamente secretos de potentados da política e da economia que se reúnem periodicamente, sob precauções de segurança maiores que as de qualquer encontro de chefes de Estado, para planejar a implantação de um governo mundial e inaugurar uma nova civilização planetária, incluindo, segundo seus críticos, a fusão de todas as religiões num novo culto biônico inspirado no lixo teosófico de Madame Blavatsky e Alice Bailey. Na última reunião dos Bildergergers, em Sintra, Portugal, a cidade inteira foi bloqueada à entrada de repórteres, enquanto, fechados a sete chaves, longe de toda fiscalização crítica, tipos como os Rockefellers, Gorbachov, George Soros e, modéstia à parte, o nosso Fernando Henrique Cardoso, inventavam o mundo em que vão viver nossos netos.

Ao proclamar sua adesão aos objetivos das conferências Bilderberg e Wehrkunde, o CFR confirma ao menos uma parte do que foi denunciado em alguns clássicos da “teoria da conspiração”, como None Dare Call It Conspiracy, de Gary Allen e Larry Abraham (Sealbeach, California, Concord Press, 1972), e sobretudo o mais recente e informado The Brotherhood of Darkness, de Stanley Montieth (Oklahoma City, Hearthstone Publishing, 2000).

Essa confissão basta para explicar por que, arriscando atrair o ódio da base conservadora que o elegeu, o presidente George W. Bush, pertencente a uma família tradicionalmente ligada ao CFR, insiste em dar seu apoio ao projeto de anistia para doze milhões de imigrantes ilegais, elevando ao nível de uma ameaça apocalíptica os riscos de segurança que, por outro lado, ele anuncia querer controlar com mão de ferro. O projeto não só conta com a rejeição maciça do eleitorado americano, mas foi apresentado por dois políticos que Bush teria razões de sobra para considerar seus inimigos: Ted Kennedy, o mais devotado patrono de todas as causas esquerdistas, e John McCain, um republicano que mesmo examinado em microscópio não se distingue facilmente de um democrata.

Os interesses maiores do globalismo, evidentemente, transcendem as considerações eleitorais, o respeito pela vontade popular e a profunda inimizade política. Segundo o documento do CFR, George W. Bush, o presidente mexicano Vicente Fox e o primeiro-ministro canadense Paul Martin já se declararam “comprometidos” com a causa ali anunciada, quando do seu encontro no Texas em 23 de março de 2005.

No entanto, seria ingenuidade imaginar que o apoio da elite globalista ao estupro das fronteiras se limita a declarações de intenções. Ele inclui o planejamento e a sustentação financeira de ações políticas decisivas.

O relatório “Building a North American Community” foi publicado sob o patrocínio de um grupo de grandes empresas, entre as quais a Archer Daniels Midland Corp., ADM, o maior suporte financeiro do senador Sam Brownback. Logo após receber uma bolada de dinheiro da ADM, esse republicano do Kansas saiu alardeando apoio ao programa de anistia para os ilegais, anunciando que o fazia por piedade cristã.

A luta dos globalistas pela causa mais impopular que já se apresentou na arena política dos EUA também não se contenta com subsidiar manobras parlamentares. Inclui a arregimentação das massas e a ajuda a protestos violentamente antiamericanos. O Boletim G-2, publicado pelo assombroso repórter Joseph Farah como apêndice de seu jornal eletrônico WorldNetDaily, revela na sua última edição os principais suportes financeiros por trás dos movimentos que, para muito além da anistia aos ilegais, visam a entregar ao México os territórios do Texas e da Califórnia. Os mais poderosos entre esses movimentos são “La Raza”, “Lulac” (League of United Latin American Citizens) “Maldef” (Mexican American Legal Defense and Educational Fund) e “Mecha” (Movimiento Estudiantil Chicano de Aztlan). Os quatro são financiados por fundações e corporações milionárias associadas ao CFR, como Rockefeller e Ford, Bristol-Meyers Squibb, Chemical Bank, Chevron, Chrysler, General Motors, General Electric, Lockheed, Rockwell, Southwestern Bell, Quaker Oats, Verizon Foundation, AT&T Foundation e o Open Society Institute de George Soros. “ La Raza” foi praticamente criada pela Fundação Ford.

Esses quatro movimentos organizaram os recentes protestos que hastearam bandeiras mexicanas pelas ruas dos EUA e anunciaram, nas palavras de Mario Obeldo, líder histórico da Mecha, condecorado em 1998 por Bill Clinton, que “a Califórnia vai ser um Estado hispânico: quem não gostar vai ter de sair”.

A alta elite financeira e a militância vociferante, que os iluminados comentaristas da nossa mídia apresentam como os dois pólos de um conflito de vida e morte causado pela “desigualdade” e pela “injustiça social”, são exatamente uma só e mesma força. E o que move o conjunto não é nenhuma das “causas sociais” impessoais e anônimas que a pseudociência ensina serem os motores da história humana: é o planejamento vindo de cima, acompanhado dos meios financeiros, publicitários e políticos de realizá-lo.

Espero que o leitor mais desperto compreenda, à primeira vista, o quanto esses fatos tornam inviável e suicida o empenho de continuar pensando o mundo segundo as linhas usuais propostas pela tagarelice intelectual dominante. A identificação de globalismo e americanismo, por exemplo, que a totalidade das nossas classes falantes dá por pressuposta como elemento básico para a compreensão da política internacional, é uma besteira sem mais tamanho, e quem quer que insista nela depois do documento do CFR deve ser considerado um desinformante profissional ou um idiota incurável.

O aspecto mais deplorável em tudo isso não é somente que a humanidade seja arrastada por elites ferozmente ambiciosas em direção a objetivos que não lhe são sequer informados. É que as próprias ciências sociais, intoxicadas de conceitos explicativos que não explicam nada, estejam tão desarmadas para dar conta dos fatos de magnitude incomparável que estão, neste momento, determinando os destinos do mundo. Quando os agentes maiores do processo histórico têm planos que vão além da compreensão da intelectualidade média – para não falar da opinião pública em geral --, é inevitável que esses planos sejam postos em prática sem qualquer possibilidade de discussão crítica. Da noite para o dia, a humanidade atônita despertará num mundo novo, sem saber como foi parar ali nem quais são precisamente as regras do jogo. A ignorância geral terá se tornado um dos pilares do poder constituído. E o grupo dominante estará separado do povo por uma distância similar à que existe entre os deuses do Olimpo e uma multidão de cupins no subsolo.

Meus alunos são testemunhas do esforço que tenho feito para substituir noções pré-históricas de sociologia e ciência política por ferramentas descritivas mais adequadas à presente situação do mundo. Esforços similares vêm-se desenvolvendo em vários centros, mas sempre à margem da corrente acadêmica principal, congelada num verbalismo obsoleto e presunçoso que, se serve de alguma coisa, é de instrumento publicitário para a implantação de políticas que os próprios porta-vozes desse discurso não enxergam nem compreendem.

Não é preciso dizer que, baixando do plano internacional ao nacional, nada dos acontecimentos políticos locais pode ser explicado sem referência ao novo esquema de poder que está se formando no planeta. O apoio descarado das fundações globais bilionárias a movimentos revolucionários como o MST é o fato fundamental que vai determinar o destino nacional nos próximos anos, e os poucos que costumam mencioná-lo, como o sr. Lyndon LaRouche, só o fazem pelo viés de seus próprios planos, que não têm nada a ver com um desejo sincero de compreensão do processo.

Se a esquerda continua obscurecendo suas próprias ações com o discurso padronizado que camufla as verdadeiras relações de poder, nos círculos liberais e conservadores a discussão atém-se obsessivamente a proclamações doutrinais gerais que não ajudam em nada a esclarecer o que está se passando.

Para mim já se tornou evidente, por exemplo, que o sucesso no plano do Foro de São Paulo, a implantação da URSAL, União das Repúblicas Socialistas da América Latina, não somente não se opõe em nada aos objetivos do globalismo, mas contribui decisivamente para eles, fomentando uma integração regional que provocaria orgasmos em Hans Morgenthau e que, a longo prazo, só tornaria a América Latina ainda mais dependente dos bancos internacionais.

E não me venham com a ilusão risível de que o petróleo venezuelano é uma temível arma antiimperialista. Ninguém no CFR ou nos círculos governamentais americanos ignora que o Estado do Colorado tem reservas de petróleo jamais exploradas, equivalentes a vinte vezes o total das reservas da Arábia Saudita. No Brasil ninguém sabe disso, porque não saiu naquela porcaria do New York Times. Mas o pessoal que em Washington lê revistas especializadas sabe que, se existe um país imune a chantagens petrolíficas (e, de quebra totalmente desnecessitado do petróleo do Iraque, para não falar da Venezuela), são os EUA.

Isso não quer dizer, é claro, que os planejadores globalistas sejam mentes geniais capazes de acertar em tudo. O Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (North American Free Trade Agreement, Nafta), concebido pelo próprio CFR como um prefácio à integração total de EUA, Canadá e México, foi um fracasso sublime, e nem por isso os planejadores globalistas se deram por achados. Desde o Nafta, segundo dados da ONU, o número de lares mexicanos abaixo da linha de pobreza (menos de 60 dólares por mês) subiu de 60 para 76 por cento, enquanto o preço das tortillas, alimento básico da população, aumentou em 40 por cento. Os contribuintes americanos também não ganharam nada com isso, tendo hoje em dia de arcar com subsídios de 40 por cento para sua produção nacional de milho. E daí? Quando um sujeito acredita que tem na cabeça a solução para os males do mundo, nada detém sua volúpia de remexer os pilares do cosmos em nome de sua esplêndida utopia. Miséria e prejuízo são detalhes desprezíveis ante a grandiosidade épica dos planos globalistas.

***

Um artigo do sr. Arnaldo Jabor publicado no Caderno 2 do Estadão do dia 25 está, segundo me informam, obtendo grande repercussão em São Paulo. Nele o comentarista do Jornal Nacional queixa-se de que a superabundância de provas e documentos da criminalidade petista não é suficiente para tirar o judiciário da sua renitente indiferença. Todos “riem da verdade, viram-lhe as costas, passam-lhe a mão na bunda”. Tão profundo é o contraste entre os fatos conhecidos e o cinismo da sua negação oficial, que isso, diz o cronista, está resultando até numa “desmoralização do pensamento”: “A existência desses tipos de mentirosos está dissolvendo a nossa mídia. Esse neo-cinismo está a desmoralizar as palavras, os raciocínios. A língua portuguesa, os textos nos jornais, nos blogs, na TV, rádio, tudo fica ridículo diante da ditadura do lulo-petismo ... as palavras estão sendo esvaziadas de sentido ... o Lula reeleito será a prova de que os delitos compensaram. A mentira será verdade e a novilíngua estará consagrada.”

Lembro-me claramente de ter escrito tudo isso, quase nos mesmos termos, numa época em que o sr. Jabor estava ocupadíssimo embelezando a imagem de São Lulinha e ajudando a preparar o advento do estado de coisas que agora ele mesmo deplora.

A dissolução do idioma, por exemplo, não é um efeito da ditadura petista, mas uma condição prévia, criada propositadamente por uma vasta ação cultural sem a qual ela jamais teria vindo poder a implantar-se. Uma coisa é diagnosticar o processo desde os indícios sociais que denotam o seu curso em formação, outra completamente diferente é constatar o fato consumado que, se discutido abertamente em tempo, teria podido ser evitado. Na época em que escrevi textos como “Língua petista” (Zero Hora, 20 de outubro de 2002), “Língua dupla e estratégia”, O Globo, 2 fev. 2002), “Reclamação inútil” (Zero Hora, 14 de dezembro de 2003) ou “A clareza do processo” (Zero Hora, 15 de junho de 2003), para não falar do meu livro de 1993 (sim, 1993), “A Nova Era e a Revolução Cultural” , a irresponsabilidade geral das classes falantes, incluindo o sr. Jabor, me respondeu com a mesma indiferença cínica que agora elas se queixam de encontrar no judiciário.

Se o sr. Jabor quisesse mesmo saber como chegamos ao descalabro que hoje o escandaliza, bastaria que prestasse atenção aos programas da mesma TV onde trabalha, que ao longo dos anos prepararam a Nação para cair na fraude da superioridade moral da esquerda e para embriagar-se no mito da pureza lulista. A Rede Globo de Televisão foi a grande responsável pela implantação da novilíngua no país. E, se hoje o sr. João Roberto Marinho dá um discreto apoio a organizações conservadoras, seu jornal e sua TV continuam a serviço do mais descarado esquerdismo. Compreendo que o sr. Jabor não possa denunciar seus próprios patrões. Eu mesmo não podia fazê-lo quando escrevia para O Globo, limitando-me então a diagnósticos gerais na esperança de que o leitor, com base nas descrições suficientemente claras que eu lhe fornecia, desse nome aos bois. Mas o sr. Jabor, ao denunciar com atraso aquilo que um seu colega sacrificou o emprego (aliás dois) para denunciar em tempo, poderia, sem citar o antecessor, o que seria mesmo demasiado doloroso para sua vaidade, ao menos reconhecer genericamente que está chegando tarde, que está falando na condição de cúmplice moral arrependido e não na de vítima inocente escandalizada. Lembro-me de que tanto falei das coisas que agora ele proclama, que, na época (quer dizer, no tempo e na revista “Época”), cheguei a ser acusado de obsessivo e redundante.

A capacidade do sr. Jabor como diagnosticador de males nacionais consiste apenas no seu timing oportunista de só dizer as coisas quando todo mundo já sabe delas e posar, então, de profeta do acontecido. O sr. Jabor não é solução: é parte do problema. A frouxidão cômoda da sua consciência moral, no entanto, não é característica individual dele (se fosse, eu nem tocaria no assunto nesta coluna, que não tem nada a ver com a vida pessoal de quem quer que seja): é um vício geral da classe jornalística, empenhada em exigir dos políticos uma correção ética superior à que ela própria é capaz de manter.

Detalhe esclarecedor

Eu mal tinha enviado este artigo ao Diário do Comércio, quando chegou um despacho da Associated Press com a informação de que o parlamento mexicano acabava de aprovar a liberação do porte e uso de cocaína, maconha, heroína, LSD, anfetaminas, ecstasy e até 2,2 libras (sim, quase um quilo!) de peiote, o cacto alucinógeno que a empulhação literária de Carlos Castañeda celebrizou nos anos 70 como uma fonte de conhecimentos espirituais, porca miséria. A lei precisa ainda do aval do presidente Fox, mas, acrescenta a agência, “isso não parece ser um obstáculo”. Um porta-voz de Fox já demonstrou a satisfação do presidente com a medida, anunciando, com cinismo exemplar, que ela facilitará o combate ao narcotráfico.

A nova lei aumentará incalculavelmente o afluxo de jovens americanos viciados ao território mexicano, e é vista com maus olhos pelas autoridades políciais dos EUA, mas não resta dúvida de que ela dá um passo enorme em direção à supressão das fronteiras nacionais, pretendida pelo CFR e pelos Bilderbergers. Nos círculos globalistas, o maior financiador das campanhas pela liberação das drogas no mundo é George Soros -- não por coincidência, também um dos mais generosos doadores de dinheiro para os movimentos de mexicanização da Califórnia e do Texas. Por enquanto, a multidão ainda não atinou com a unidade estratégica por trás de mutações catastróficas de escala global que aparecem na mídia idiota como frutos espontâneos da metafísica do progresso. Aos poucos, a identidade dos agentes por trás do processo vai aparecendo -- e, no fim, como anuncia a Bíblia, “sua loucura se tornará visível aos olhos de todos”.

Olavo de Carvalho

Retirado do Diário do Comércio, 01 de Maio de 2006.

terça-feira, agosto 15, 2006

Troika de direita

Já visitou as páginas das revistas virtuais Mídia Sem Máscara, Alameda Digital e Democracia Liberal? As diferentes vozes da Direita Conservadora à distância dum "clic".

Propostas da NovaDemocracia assustam alguns....

No meio de muitos encómios que foram feitos, têm nos últimos dias surgido também alguns comentários menos favoráveis às propostas feitas pela NovaDemocracia no sentido de tentar alguma forma de união das forças políticas da direita portuguesa.

Mas entre algumas barbaridades que foram ditas, avulta a frase de Marcelo Rebelo de Sousa, "O PSD pode disputar o centro com o PS e não discutir a direita com a extrema-direita".

Trata-se de um comentário maldoso, ignorante e desfasado da realidade, como tantos outros feitos por este professor que já nos habituou a comentar livros sem ter passado da capa e da contracapa! Mais uma vez, prova que não leu minimamente os documentos "doutrinários" da NovaDemocracia, limitando-se a utilizar um cliché próprio de extremistas como o Bloco de Esquerda. Por este andar se calhar ainda veremos Marcelo ao lado de Freitas do Amaral, na sua colagem ao BE....

Mas muito desta posição também se deverá ao despeito sentido por quem no seu tempo de líder do PSD tentou uma aliança com quem não é de confiança e acabou por perder o lugar.... Mas a inveja é um sentimento reprovável....

João Carvalho Fernandes

Retirado do Democracia Liberal.

A direita

Os factos políticos que se seguiram ao 25 de Abril de 1974 desvirtuaram "in totum" a realidade política actual.

Decorridos 31 anos após o 25 de Abril Portugal continua prisioneiro do pacto "MFA PARTIDOS". A direita democrática foi impedida de se fazer ouvir, de transmitir a sua mensagem. Após o 25 de Abril surgiram vários partidos políticos de direita como o Partido Liberal, o Partido do Progresso e mais tarde o Partido da Democracia Cristã. A direita democrática tinha os seus partidários filiados naqueles partidos que, porém, tiveram uma vida efémera. Curiosamente a vida política post 25 de Abril foi tutelada por militares que, maioritariamente, eram de esquerda e muitos deles filiados no Partido Comunista ou próximos. Hoje , entendo, que embora o Pacto "MFA PARTIDOS" não vigore existe ainda na sociedade portuguesa uma Constituição filosoficamente idealizada na área socialista.

Chamar direita ao PSD/PPD ou ao CDS/PP é mentir sobre a realidade poítica. Curiosamente Marcelo Rebelo de Sousa homem profundamente de direita não gostou do almoço de Manuel Monteiro e Ribeiro e Castro. E porquê? Porque sendo de direita concluiu que ele próprio não devia estar no PSD mas sim no Partido da Nova Democracia já que é um conservador liberal. Vem tudo isto a propósito de concordar com Manuel Monteiro no sentido da realização de um congresso da direita onde se iriam congregar pessoas que estão espalhadas nos vários partidos do sistema. Isto é aquelas pessoas que estão no PS , PSD ou CDS deviam uma vez por todas investir nelas próprias, deixarem as benesses ou favores económicos (se é que os têem) e por bem a Portugal darem uma sapatada na mentira que é a realidade política actual, fruto de um lamentável 25 de abril viciado cuja génese ainda hoje influência a filosofia dos partidos do sistema.

Raul Lopes

Retirado do Democracia Liberal.

O mundo perigoso


Em 1995, Ramzi Yusef (que precocemente dinamitara as Torres Gémeas, dois anos antes) foi julgado e condenado por uma ideia macabra: tratava-se de usar explosivo líquido (nitroglicerina), virtualmente indetectável nos aeroportos comuns, para destruir, ‘em vagas’, uma série de voos transatlânticos, causando o caos nas principais cidades do mundo.

O plano descoberto no Reino Unido, que começou a ser investigado em Maio (e que não aprece assim ligado à situação no Líbano) e que é atribuído a uma ‘al-Qaeda renascida’, tinha muitas semelhanças com isto. Sob a cobertura de uma empresa de segurança, um grupo sofisticado experimentou nitrato metílico, formamida, e uma mistura de nitrometano, sensibilizador e composto energético.

Os alvos eram 20 voos de companhias aéreas inglesas, americanas e europeias, possivelmente na madrugada do dia 11 (outra vez o número da morte). Esta aceleração de preparativos levou a uma operação de segurança gigantesca. Claro que vários segmentos do público estão fartos de falsos avisos e alegações não fundamentadas. Mas quando o lobo chegar, quem sofre é quem não acreditou em Pedro.

Guerra a fingir

A Reuters viu-se acusada de retocar fotografias de Beirute a arder, para sugerir uma destruição redobrada. Suspendeu o repórter Hadnan Hajj e retirou a imagem.

Há dúvidas sobre o enquadramento de filmes e o PM libanês teve de corrigir, ao vivo, uma informação errada sobre baixas em Houla. Nas zonas de choque, os jornalistas são impedidos de filmarem à vontade. Não há imagens, por exemplo, de alvos militares atacados ou destruídos.

Também não sabemos, do lado libanês, quantos milicianos do Hezbollah morreram nas operações. Numa guerra em que um dos lados não usa uniforme, todos os seus mortos aparecem como ‘civis’. Ninguém tem dúvidas sobre os graus de destruição, no Líbano e na Galileia. Mas face aos ecos perturbantes de manipulação, uma das coisas que faz falta no conflito é uma agência independente que avalie os estragos, identifique as vítimas e investigue as alegações de ‘crimes de guerra’. Estes são, não a violação de qualquer vaga ‘lei moral’, mas a directa infracção de normas de direito positivo, convencionadas e codificadas, aprovadas em Genebra e na Haia, a partir de 1864, e sobretudo de 1899. Nessa altura, as nações ‘civilizadas’ puseram-se de acordo: se não era realista ‘proibir’ a guerra, pretendia-se, ao menos, mitigar os seus efeitos sobre os inocentes.

Decisão Impossível

Shimon Peres absteve-se, mas o gabinete de segurança israelita decidiu expandir as operações terrestres no Líbano, pelo menos até ao planalto de Nabatea, a Arnun, a noroeste do rio Litani. Horas antes substituíra generais e comandantes, face às críticas de ineficácia táctica, que temos vindo a citar.

Claro que mais ‘botas no solo’ significa muito mais baixas, mas para Jerusalém não há, neste momento, saídas airosas.

Nuno Rogeiro

Retirado do Correio da Manhã, 13 de Agosto de 2006.

Cuba: sem transição nem solução?


A transmissão pessoal e familiar do poder em Cuba, de Fidel Castro ao irmão Raúl, mostra a índole do regime e dos regimes comunistas: teoricamente, governos "populares", ou de uma vanguarda partidária esclarecida e portadora da verdade histórica, acabam, como qualquer satrapia reaccionária, nas dinastias familiares.

Porque aí - como nas sociedades primitivas - a família é a base da confiança.

A longevidade da ditadura cubana, para além do facto de ser uma "ilha", por isso mais fácil de controlar e fechar, tem a ver com a personalidade "carismática" do líder e fundador da revolução e com o facto de ele explorar, sempre, o factor nacional e nacionalista, o antiamericanismo, muito mais que o "internacionalismo" comunista.

Não se esqueça de que Cuba foi o último território do Império espanhol das Américas e que os norte-americanos tiveram um papel chave (e não muito digno) na independência do país, em que instalaram uma hegemonia político-económica que durou até à queda de Fulgêncio Baptista.

Fidel foi romantizado, nos anos 60, depois da sua vitória, na Europa, resultado da queda, por dentro, da oligarquia de Baptista ligada (segundo The Godfather, parte II) aos patrões das mafias americanas!

Para uma esquerda abalada pela revelação dos crimes do comunismo soviético e chinês, pelo fracasso dos partidos francês e italiano na Europa Ocidental, pelos insucessos no Médio Oriente e em África, os "barbudos" cubanos pareciam feitos de encomenda para tomar o lugar dos "bons" da fita: eram "libertadores", numa área - a latino-americana - marcada por grandes abismos sociais, pela hostilidade aos "gringos" do Norte, por ideais de justiça e de melhoria de vida, disseminados pela tradição cristã e pelos intelectuais de classe média na sociedade.

O problema é que, uma vez conquistado o poder e reprimida qualquer resistência, após as veleidades de expansão revolucionária por toda a América Latina e África e o seu fracasso, que levou à derrota da "esquerda revolucionária" e ao poder ditaduras militares de resposta ao "frentismo" de esquerda - Chile e Brasil -, ou ao terrorismo radical - Argentina e Uruguai -, a sociedade cubana pouco ou nada mudou para a maioria dos seus habitantes.

Continuaram a viver miseravelmente, num Estado policial, em parte alimentados pelas remessas dos parentes refugiados na Florida, em parte pelas generosas ajudas económicas, ontem da URSS, hoje do megalómano Hugo Chávez, caudilho da Venezuela, tão cego no seu ódio a Bush e a Washington que se solidariza com o Irão e a Coreia do Norte.

Como irá tudo terminar?

Os regimes autoritários de longa duração e muito personalizados não costumam sobreviver aos seus fundadores.

Os regimes autoritários peninsulares - de Salazar e Franco - não sobreviveram muito tempo à doença e morte dos seus líderes, acabando um por ruptura e outro por transição dirigida.

E ambos tinham no plano económico-social, sobretudo nos anos finais, uma dinâmica de desenvolvimento que falta em Cuba, e tinham criado e desenvolvido classes médias que foram depois o suporte da implantação democrática.

Além disso, nem Salazar nem Franco deixaram o poder a um irmão ou parente, chefe máximo do aparelho militar e securitário...

Resumindo: se o "líder máximo" não voltar ao poder, sem o seu merecido ou imerecido "capital" de carisma, é muito duvidoso que o regime cubano, sob a pressão da sua classe média - que está em Miami - possa resistir, sem agravar a repressão, num país que tornou o turismo, além dos subsídios petrolíferos de Chávez, na sua fonte de recursos.

O mais natural, pois, é assistirmos a uma solução à Europa Oriental - pressão popular, mudanças e choques na classe dirigente e queda por implosão; ou de uma versão mais brutal, "à romena", com ajuste de contas violento dentro do partido e uma saída militar.

Aliás, foi para, antecipadamente, prevenir esta solução militar que os Castros (Fidel e Raúl) organizaram a liquidação do general Ochoa, o herói cubano da guerra de Angola, cuja popularidade entre os soldados e o povo era enorme, nos anos 90.

Uma execução sumária, depois de um processo sumário, a partir de uma "montagem" que deixou espantados e escandalizados os próprios círculos de "incondicionais" euro- -americanos do regime de Cuba.

Que, entretanto, com o seu ódio a Bush a aos EUA, já esqueceram outra vez tudo...

Maria José Nogueira Pinto

Retirado do Diário de Notícias, 11 de Agosto de 2006.

sexta-feira, agosto 11, 2006

Jair Bolsonaro falando algumas verdades sobre a esquerda

terça-feira, agosto 08, 2006

A reler

Entrevista a Vasco Pulido Valente no É a Hora.

A rever

The Number 1 Song in Heaven dos Sparks.

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A força inesperada dos extremistas

Israel está a aprender uma dura lição, e ela serve igualmente para outros países, e Governos, que preferem o apaziguamento e a negociação com grupos extremistas, sem pátria mas com fortes ligações, que estão agora a entrar numa nova e mais perigosa fase, dadas as suas capacidades destrutivas.

Pela primeira vez na História, um grupo de radicais afronta, diariamente, o mais poderoso e organizado exército do Médio Oriente, que sempre descansou na fama de ter destruído, ao mesmo tempo, e em várias frentes, as forças armadas de vários países coligados. Esse é o primeiro problema.

Os israelitas, mesmo com umas Forças de Defesa excepcionalmente bem estruturadas e organizadas, e com os mais modernos meios de combate, comprados e fabricados ou adaptados no país, estão a enfrentar, sem remédio eficaz, um grupo de guerrilha que lança diariamente centenas de pequenos mísseis contra as suas cidades, num claro desafio ao poder terrestre, aéreo e marítimo do Estado judaico.

É óbvio que seria para Israel mais fácil enfrentar um exército organizado, numa batalha aberta, como já aconteceu, e com sucessos extraordinários, mas este tipo de luta, onde os guerrilheiros do Hezbollah atacam em pequenos grupos, com uma grande capacidade de mobilidade e meios facilmente deslocáveis, não estava nos códigos de aprendizagem dos israelitas, que sempre acreditaram que resolveriam estes problemas com alguma demonstração de força, e em poucos dias.

Não é o caso, e esta lição está a custar muito às forças armadas de Israel, e de uma forma que dói: a sua imagem de força preparada para qualquer operação já não corresponde à realidade. A credibilidade ainda está intacta, bem como a sua mítica invencibilidade, mas não deixa de desgastar muito, e violentamente, que todo aquele poder militar, visível nas imagens da televisão, não consiga impedir que os rockets continuem a cair nas cidades de Israel, causando vítimas inocentes em civis desarmados.

Pior: os combates terrestres têm demonstrado que há uma nova postura, ou crença, dos membros do Hezbollah, que, embora em número muito reduzido, combatem ferozmente e até à morte, o que surpreende a força opositora.

Surpreende e obriga a um "trabalho" contínuo de destruição caso a caso, sem grandes avanços nem vitórias elementares.

Israel está agora a perceber que tem de mudar alguma coisa na sua estratégia para enfrentar este tipo de ameaça, e as outras mais convencionais, e acima de tudo impedir, ou prevenir, em tempo útil, que grupos extremistas se organizem, treinem e armem durante anos, no quintal do "vizinho".

Também parece claro, e indiscutível, desta vez, que há países que continuam a apostar na destruição da nossa civilização e religião, por todos os meios, mesmo que interpostos. Para o Irão e a Síria - no primeiro caso esta situação até dá mais tempo para continuar o programa nuclear -, alguns grupos radicais, que eles alimentam, financiam e armam, são verdadeiros cordeiros sacrificiais que desgastam o "inimigo" e testam, a cada momento, o seu poder de retaliação.

Em vez desta luta inglória, Israel bem gostaria de trocar o Hezbollah pelos exércitos da Síria e do Irão, porque aí, nesse campo de guerra aberta e tradicional, mesmo que com armas que já nada têm de convencional, a sua destruição estaria assegurada, e de forma rápida e limpa.

Pensa-se, agora, que a melhor forma de resolver a actual situação é colocar uma força multinacional entre Israel e uma faixa do Líbano, mas só por ironia é que isto será uma solução de futuro. Com ou sem capacetes-azuis, Israel já percebeu que existe uma nova ameaça, armada até aos dentes e disposta a tudo, com a qual terá de lidar em permanência e a qualquer momento. Só por ingenuidade é que se pode aceitar que uma faixa de 15 ou 20 quilómetros vai atenuar o perigo colocado pelo Hezbollah, quando já se entendeu que eles estão ou estarão armados com mísseis que poderão atingir todo o território israelita. É, necessariamente, uma ideia de Verão, daquelas que só servem para apaziguar as consciências dos nossos países.

Tudo o que agora for feito para manter intacta a estrutura formal e informal do Hezbollah, e as suas fontes de ajuda, é uma cedência ao extremismo, que um dia pagaremos pesadamente. O Hezbollah não é um país soberano, ou um Governo legítimo, ou uma força formal, mas um grupo extremista, fanático, poderosamente armado, e disposto a tudo para fazer triunfar a sua "guerra santa", que é a nossa destruição. Cuidado, por isso.

Luís Delgado

Retirado do Diário de Notícias, 07 de Agosto de 2006.

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domingo, agosto 06, 2006

O espaço das nações


A arrumação dos povos no espaço é o acto fundacional da sociedade internacional, como a arrumação do espaço interno, em termos de lei, ordem, direitos e deveres, funda a “polis”. Um bom manual de História explica o problema: a divisão da terra, o traçado do “limes”, da fronteira, depois sacralizada com a sucessão das gerações como pátria, “vaterland”, terra dos pais. A partir do século IV, a questão essencial do Império Romano, a Oriente e a Ocidente, foi acomodar as “nações” bárbaras - godos, vândalos, suevos - no espaço imperial; ora comprando-os, ora repelindo-os, ora integrando-os - “romanizando-os”.
Essa luta pelo espaço nunca foi, em si e por si, jurídica. Só depois de haver comunidade política estabelecida, “polis”, há Direito. Pode haver um “direito natural” entre as pessoas - com base na sua comum natureza de filhos de Deus, ou seres racionais; mas não há tal direito entre os povos e apesar das utopias megalómanas ou só simpáticas, desde os primeiros milenaristas a Kant, o Direito Internacional ainda é, em substância e sobretudo em eficácia, “um direito externo dos Estados”. Estas considerações só me parecem necessárias, quando, de regresso de uma semana no Adriático, numa região de histórias de “encontros”, pacíficos e armados, de culturas e civilizações, vejo o debate doméstico sobre a guerra do Líbano: “ideológico” e “partidário” até à medula, quando não politicamente correcto ou arrogantemente pedagógico.
Ora a equação médio-oriental tem a ver com o estabelecimento, no espaço, um espaço historicamente entendido como seu, pelos Judeus da Diáspora, em 1948, do Estado de Israel. E é de pensar, nesta matéria, aquela referência – que Jünger faz nos seus Diários - de que dos povos subjugados pelo Grande Rei, só chegou até nós este “povo escolhido” onde Cristo nasceu e morreu, povo a que a crença na aliança divina deu uma vida eternamente atribulada. Que se manteve pela prática das regras das sociedades antigas - repetição de mitos e ritos, endogamia, superioridade do grupo face aos membros e, sobretudo, unidade perante os “gentios”. Mas que gerou os construtores de uma “modernidade” subversiva de tudo isto, com Marx, Freud, Kafka, Trotsky e os Rotschild, Einstein e os grandes produtores de Hollywood.
Mas Israel independente, para sobreviver, teve que adoptar todas as regras de sobrevivência de povos nos meios hostis: militarização da juventude, controlos dos “não-nacionais", “intelligence d'abord”, guerra preventiva. Isto é, práticas de razão de Estado de todas as minorias ameaçadas ou provadas no extermínio, dos espartanos aos boers ou aos tutsis.
Contradições? Leiam-se os “liberais” da diáspora americana, como Philip Roth e (veja-se) Woody Allen e os conservadores, de Podhoretz aos Kristoll e percebe-se melhor o problema. Do outro lado estão os Árabes, com uma História ao revés. Grandes à partida, aterrando a África e a Europa até Poitiers; já otomanos, derrotados em Lepanto pela Aliança Católica e o génio estratégico do bastardo de Carlos V, D. João da Áustria; e parados de vez, em Viena por Sobiesky.
E depois só decadência: frente aos russos, aos austríacos, aos balcânicos, até à queda sob o jogo colonial de britânicos, franceses e espanhóis. Os senhores das grandes cidades e culturas da Bagdad de Harum-al Rachid à Constantinopla da Sublime Porta, aos berberes de Argel e do Riff, foram reduzidos a situações coloniais.
Destas humilhações nasceu, entreguerras, o movimento dos «irmãos Muçulmanos», o pai do nacionalismo islâmico e dos “nacionalismos” estatais islâmicos, os inspiradores ideológicos dos “jovens oficiais” modernizantes, dos voluntários da Internacional Islâmica da Al-Qaeda, do Hamas ao Hezbollah .
Assim esta é também a colisão de dois “nacionalismos” em busca de espaço, do mesmo espaço. Um espaço simbolizado por Jerusalém - cidade santa de toda a gente - que podia ser salomonicamente internacionalizada, se a comunidade internacional servisse para alguma coisa!
Israel bate-se, sempre, contra o muro, e por isso tem que ser rápido e impiedoso na resposta; os árabes carregam a memória da grandeza e a carga da humilhação e de uma “imagem” negativa no mundo euro-americano. (Desde Lawrence da Arábia, de um inglês, David Lean, que não se vê um árabe decente ou normal no cinema). Com um fundo histórico, geopolítico e cultural destes, andar à procura de uma justiça e razão absolutas, dos “bons” e dos “maus” da fita, é um exercício inútil, senão pernicioso. Próprio para “politicamente correctos” de todos os quadrantes, sejam esquerdistas da ultra-esquerda, direitistas da esquerda ou empalhados ao centro. Talvez a tão injuriada “realpolitik”, que não procura a razão, mas avalia as razões e as forças dessas razões, que mede os poderes para dissuadir, que procura construir a partir do que é, a “realpolitik” tão denegrida pelo coro dos sábios e vestais do costume seja, melhor ou pior, o caminho a seguir.
Israel terá que reconhecer um Estado palestiniano plenamente estatal e independente se quiser ter paz; e o mundo árabe terá que perceber que Israel tem direito a viver, porque está disposto a bater-se duro por esse direito. E terão que dividir território, traçar fronteiras, e portar-se como Estados normais e vizinhos.
Querer resolver as coisas a partir de textos utópicos, redigidos por cínicos na euforia das novas ordens, ou em sentenças moralizantes e boazinhas que comovem as almas laicas suburbanas e electrizam os espártacos de serviço, é tratar a guerra do Líbano em termos de “silly season”.

Jaime Nogueira Pinto

Retirado do Expresso, 05 de Agosto de 2006 (via Sexo dos Anjos)

Erros e missões


Seguindo os conselhos dos críticos, e colhendo os frutos do chamado ‘Projecto Yatah’ (sobre operações de baixa intensidade em meio urbano), o contestado chefe de Estado Maior israelita, Dan Halutz (que fora, significativamente, o comandante da aviação), decidiu começar a usar mais incursões terrestres.

Com todos os riscos para os soldados empenhados (lembremos Setembro de 1997), só aquelas permitem distinguir combatentes e civis, e dissipar a ideia de que a ‘Operação Mudança de Direcção’ é um mero exercício de cega destruição aérea.

Claro que as acções de comandos, como o batalhão Egoz em Baalbek, em busca de uma ligação crucial entre o Hezbollah e o Irão, Mohamad Yazbek, ou o mítico ‘Shai 13’ em Taibe (Tiro), procurando mísseis de longo alcance, precisam de excelentes informações no terreno.

Informações, e não meros rumores, como a indicação de que o ‘Partido de Deus’ recebera 16 mísseis Zelzal 3, com 400 quilómetros de alcance, capazes de atacar a central nuclear de Daimona.

- Na crise do Médio Oriente, pode dizer-se que a Europa tem mais olhos que Barroso. França, Espanha, Itália, Turquia, possuem iniciativas próprias, Blair quer “repensar um eixo de moderação” (words, words, words), e o quixotesco Só-lana fica a falar só-zinho. Super-poder, ou o rato que ruge?

- Chama-se, no jargão astrofísico, Oph 1622. A muitos anos de distância das constelações mais remotas, é um local de nascimento cósmico. Foi aí que os cientistas descobriram dois ‘planemos’ (meio estrelas, meio planetas), gémeos, girando em torno um do outro. Não sabemos o que não sabemos.

- A subida das taxas de juro do BCE aumenta a ansiedade das famílias europeias (sobretudo inglesas e meridionais), atoladas em dívidas. Onde vamos parar?

Nuno Rogeiro

Retirado do Correio da Manhã, 06 de Agosto de 2006.